segunda-feira, 26 de outubro de 2015

Detentos de Divinópolis veem no trabalho esperança de deixar presídio

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Jenifer borda peças para uma loja de Divinópolis (Foto: Marcelo Santa'Anna/Divulgação)
Se para as empresas os projetos de remissão de pena em presídios pode significar produção a custos baixos, para homens e mulheres do Presídio Floramar em Divinópolis significa esperança e a expectativa de uma vida mais digna, fora das grades. A cada três dias trabalhados, os detentos têm redução de um dia na pena. Cerca de 60 encarcerados fazem parte deste projeto e produzem juntos lençóis, jalecos e bordam biquínis.
Divinópolis, presa, detenta, prisão, remissão,  (Foto: Anna Lúcia Silva/G1)Carolina contou que matou o marido com 41 tiros
(Foto: Anna Lúcia Silva/G1)
Após matar o marido, Carolina Santos está na unidade há pouco mais de cinco meses. Em uma das máquinas de costura ela é responsável por embainhar os lençóis, que são distribuídos a unidades prisionais de todo estado. Saem do Floramar quase 10 mil peças.
Sentada em uma cadeira em frente a máquina, Carolina se mostra descontraída e a conversa com as outras mulheres que trabalham juntas em uma “cela de produção”, para ela, é uma forma de fazer o dia passar  mais rápido.
Carolina consegue elencar vários benefícios  em participar do projeto: sair da cela, se distrair  e aprender um ofício que ainda não sabia. O dinheiro que as detentas recebem, por produção, para elas é apenas um detalhe. Elas querem mesmo é ganhar dias e sair o mais rápido possível da unidade prisional.
“Com o dinheiro eu nunca me preocupei, quero mesmo a remissão da pena. Quero sair daqui”, destacou. Quando questionada se tinha vontade de construir uma nova vida, ela afirma que nunca se envolveu com coisas erradas e que o crime que cometeu foi em defesa da própria vida. “Matei meu marido com 41 anos e se eu não tivesse feito isso, eu teria morrido”, afirmou.
Carolina ainda não foi julgada pela Justiça. Ela tem filhos, e toda família é de Itapecerica, onde foi presa. Nos dias de visita, a mãe e o irmão sempre estão presentes. O que ajuda a camuflar a solidão, como conta.
Divinópolis, presídio, remissão, pena, Floramar (Foto: Anna Lúcia Silva/G1)Jenifer foi presa aos 23 anos por tráfico de drogas
(Foto: Anna Lúcia Silva/G1)
O mesmo não ocorre com Jenifer Silva, que aos 23 anos está presa por tráfico de drogas. Ela não recebe sequer uma carta da família. Vez ou outra troca algumas palavras com o namorado dela que também está preso no Presídio Pio Canedo, em Pará de Minas.
Os dois foram presos juntos pelo mesmo crime. As cartas são endereçadas de um presídio a outro. A mãe de Jenifer morreu há mais de dois anos. O pai com quem ela morou na adolescência é de Contagem. Mesmo morando com ele, a jovem resolveu sair da cidade e chegou a morar na rua. O crime entrou cedo na vida da detenta, aos 15 anos de idade, bem antes de conhecer o namorado.
Ainda segundo ela, ninguém da família a visita por conta do procedimento de revista para entrar no local. Como não tem família na cidade, a unidade abriu uma exceção para que a sogra faça as visitas a ela. “Me sinto solitária, sem família por perto, com irmãos e pai afastados de mim. Tenho muita carência familiar”, disse.
A oportunidade de trabalhar para conseguir diminuir dias na pena veio depois de um mês que a jovem havia sido presa. Ela borda biquínis e maiôs para uma loja de Divinópolis que propôs uma parceria ao Presídio Floramar há mais de um ano. As peças mais delicadas chegam a consumir toda a jornada diária de oito horas de trabalho da detenta. “O que afasta a solidão, pois isso aqui é horrível. Quando a moça da loja propôs a parceria eu logo quis fazer parte. Recebi treinamento e, aos poucos, fui preparada para fazer aplicações de bijuterias e pedras nas peças”, contou.
Divinópolis, loja, biqíni, bordado, presídio (Foto: Verde Limão/Divulgação)Peças bordadas por Jenifer vão até para Indonésia
(Foto: Verde Limão/Divulgação)
O trabalho que sempre foi feito com dedicação pela jovem foi logo reconhecido pela empresa que propôs a parceria. A gerente de produção da loja de biquínis, Alcina Machado, diz que se sente gratificada em oportunizar o aprendizado de um ofício à Jenifer Silva e ainda elogiou o trabalho da jovem.
“É gratificante saber que temos a oportunidade de ajudar e, em contrapartida, ainda receber um trabalho de qualidade. A Jenifer faz o acabamento final das peças. É um trabalho minucioso, que não pode apresentar defeitos e ela, sem dúvida alguma, é muito caprichosa, responsável, faz bem feito e o mais importante, ela faz o trabalho com amor”, disse.
Mais de 60 peças produzidas pela detenta são enviadas a vários países, como a Indonésia. A gerente ainda garante que quando Jenifer sair do presídio terá emprego garantido. "Sem dúvida ela será empregada na loja quando sair, se ela quiser. Volto a dizer que o trabalho dela é perfeito e me alegra muito saber que estamos oportunizando esse aprendizado a ela. No início eu mesma ia ao presídio para treiná-la e era difícil por conta do processo, mas hoje é só orgulho”, destacou.
Ao saber do carinho de toda empresa e reconhecimento do trabalho, Jenifer se emociona. “Eu fico muito feliz, porque sempre achei que era inútil pra sociedade. Fazendo esse trabalho sinto que posso contribuir com alguma coisa. O tráfico não dá nada a ninguém, só prisão e é horrível, não quero mais essa vida”, disse.
O dinheiro que Jenifer recebe da loja fica com a sogra, cujo o filho foi preso com Jenifer. “Ela vem me visitar e o dinheiro que recebo dou a ela e ela compra tudo o que eu preciso. Tem muita coisa que eu queria que ela comprasse e não pode entrar aqui. Ela compra frutas, doces, bolachas, fico querendo chocolate, mas não pode entrar na cela”, contou.
Divinópoli, presas. presídio (Foto: Anna Lúcia Silva/G1)Nayara à direita da foto, junto com uma colega de
cela(Foto: Anna Lúcia Silva/G1)
Nayara Dias é uma das poucas detentas que estão prestes a deixar o presídio. Ela  está há um ano na prisão e agora a expectativa é grande. Com a remissão de pena ela sai este mês do presídio. “Cometi 157 (roubo), e agora a expectativa é muito grande, não quero isso mais para a minha vida”, disse.
Ao sair do Presídio Floramar os presos querem ter oportunidades, como estão sendo dentro da unidade. A maioria diz que teme por não conseguir empregos. “Todos nós que estamos aqui merecemos uma oportunidade de reconstruir nossas vidas. Uma chance de conquistar uma recolocação no mercado. E isso deveria partir não só dos governantes, mas também dos empresários em geral. O trabalho aqui dentro é uma esperança de deixar o presídio”, finalizou Gideon Gomes Diniz.
Divinópolis, prsão, projeto, jalecos (Foto: Anna Lúcia Silva/G1)Presos fazem jalecos com materiais que seriam
descartados (Foto: Anna Lúcia Silva/G1)
Jalecos
Recentemente os presos da unidade passaram a fabricar jalecos para Hospital São João de Deus (HSJD). Os tecidos usados na produção seriam descartados no lixo. Segundo  informações da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds),  são entregues cerca de 1300 jalecos por mês  ao hospital. “O material produzido é impermeável e proporciona segurança aos profissionais que atuam nos leitos de isolamento”, destacou a responsável técnica pela comissão do Plano de Gerenciamento de Resíduos de Serviços de Saúde (PGRSS) do HSJD, Graziele Lemos.
Ainda segundo a Seds, todos os detentos trabalham em troca de redução de pena, mas alguns também recebem remuneração que corresponde a três quartos do salário mínimo, cerca de R$ 590.
A diretora-geral do Presídio Floramar, Elisabete Pinheiro Fernandes, destaca que a parceria com o hospital e empresas de confecção tem um caráter pedagógico para os presos. “Além da remição de pena e da qualificação para o trabalho, eles contribuem para o meio ambiente e ajudam uma instituição que presta um serviço relevante para a população de Divinópolis”, destacou.
Fonte: G1 Globo

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